7 Dicas para você entender a responsabilidade civil dos médicos veterinários e das clínicas veterinárias e nunca mais errar.

O mercado de produtos e serviços voltados para animais de estimação é um dos que mais cresce no Brasil. Os números são tão impressionantes, que o Brasil está entre os três maiores mercados, perdendo apenas para Estados Unidos e China.

Esses números, ao mesmo tempo em que indicam o imenso campo de oportunidades existentes no setor, também demonstram a possibilidade de que um número maior de conflitos passe a existir entre os tutores dos animais e os fornecedores de produtos e prestadores de serviços pet.

Pensando nisso, este texto é elaborado para esclarecer dúvidas que podem existir nas relações jurídicas estabelecidas entre os consumidores e os médicos veterinários e clínicas veterinárias.

Se você é veterinário ou possui uma clínica veterinária, poderá aprender formas de se defender de possíveis ações judiciais e até mesmo preveni-las. Se você é tutor de um pet, terá armas muito mais efetivas para fazer valer seu direito e para escolher melhor o estabelecimento que oferecerá tratamento para o seu bem mais precioso.

Então, não deixe de acompanhar esse texto até o final!

1. A responsabilidade do médico veterinário é subjetiva.

Pouca gente sabe, mas, mesmo estando submetido ao Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade do médico veterinário é subjetiva (art. 14, § 4º, CDC).

E o que isso significa?

A responsabilidade subjetiva, para ser caracterizada e gerar o dever de indenizar, depende da existência de culpa na conduta do médico veterinário, que pode estar presente em uma das suas três modalidades: negligência, imprudência ou imperícia.

A negligência decorre de uma atuação omissa. O médico veterinário negligente é aquele que deixou de tomar alguma atitude e esta, ao final, gerou dano ao animal. Como exemplo, podemos mencionar a omissão em pedir exames antes de um procedimento cirúrgico, o que acaba ocasionar a lesão ou o falecimento do pet.

A imprudência ocorre a partir de uma atuação comissiva, ou seja, o médico veterinário fez alguma coisa que não deveria. Pode ter realizado uma cirurgia de modo indevido, por exemplo, ou qualquer outro tratamento que, ao invés de ajudar o animal, o prejudicou ou feriu.

Já a imperícia consiste na falta da técnica que se espera de um determinado profissional. Ocorre quando o médico veterinário utiliza uma técnica ultrapassada ou quando aplica de forma errada um determinado tratamento ou procedimento cirúrgico.

Qualquer que seja a hipótese de culpa, esta deve ser devidamente comprovada para que haja a condenação do médico veterinário ao pagamento de indenização.

2. A lei prevê a possibilidade de inversão do ônus da prova em casos de responsabilização de médicos veterinários e clínicas veterinárias.

Como os médicos veterinários são profissionais liberais que se encontram submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, é prevista a possibilidade de inversão do ônus da prova em casos de indenizações movidas em seu desfavor (art. 6º, VIII, do CDC).

O ônus da prova é o dever de provar aquilo que se alegou. Em regra geral, aquele que ingressa com uma ação deve provar as alegações que está fazendo.

Quando vigente a inversão do ônus da prova, admite-se que o autor da ação simplesmente narre os fatos que entende que aconteceu, sendo imputado ao réu o dever de provar que não atuou da maneira indicada pelo autor.

Isso pode acontecer tanto no caso do médico veterinário como das clínicas veterinárias, o que é ainda mais grave, porque a responsabilidade das clínicas é objetiva como veremos mais adiante.

Pensando na inversão do ônus da prova, é importante que o médico veterinário mantenha a documentação referente ao tratamento do animal muito bem-organizada, especialmente no que tange ao prontuário clínico.

Em caso de reclamação dos tutores, essa documentação pode obstar a propositura de uma ação, ou, caso mesmo assim seja proposta, pode minimizar os danos dela decorrentes.

Além disso, pela matéria debatida, é possível que as ações cíveis (e mesmo criminais, se o caso) demandem a realização de perícia. Em situações semelhantes, a manutenção de documentação sobre o animal pode ser crucial para o bom andamento da causa.

3. Médicos veterinários precavidos apresentam documentos para a assinatura dos tutores de seus pacientes.

Os médicos veterinários, justamente em razão da possibilidade de inversão do ônus da prova, têm que estar munidos de ampla documentação para trabalharem com segurança no seu dia a dia.

O primeiro documento essencial é o contrato de prestação de serviço. Esse contrato deve conter uma descrição dos serviços que estão sendo prestados, o valor que vai ser pago pelo cliente, e a forma de pagamento. O principal escopo do contrato é garantir o pagamento do serviço, de modo que os principais dados do cliente (tutor do animal) devem ser colhidos para que se tenha como localizá-lo em caso de inadimplemento.

É importante também que o contrato esteja formulado de modo a ser reconhecido como um título executivo. Títulos executivos podem ser cobrados por meio de ações de execução, as quais têm tramitação mais ágil no Judiciário.

O contrato de prestação de serviços, contudo, não é o único documento que deve instruir a relação mantida entre os clientes e os médicos veterinários.

Para cada procedimento a ser realizado, é necessário um termo de consentimento a ser assinado pelo tutor. Nesse termo, deve ser esclarecido exatamente em que consiste o procedimento, para que o tutor, ao dar seu consentimento, saiba o que está autorizando. O consentimento, assim, deve ser o que se chama de “consentimento informado”, porque ele só é conferido depois que informações completas foram fornecidas. Se não for feito desse modo, o consentimento pode ser considerado como nulo juridicamente.

O médico veterinário não pode esquecer, ainda, de encaminhar o referido termo com referência a tratamentos suplementares que se façam necessários em caso de urgência, como para transfusão de sangue, por exemplo. Sempre que possível, deverá tomar o cuidado de informar qual o custo destes tratamentos previamente.

Do termo de consentimento também deve constar se o tratamento é experimental, se oferece algum perigo, se tem contraindicações, ou, ainda, se deve ser mantido durante determinado período.

É essencial que a parte cabente ao tutor do animal fique muito clara em todos os documentos. Se ele deixar de cumprir as orientações, poderá ser responsabilizado pelos danos sofridos pelo animal.

A mesma orientação vale com relação ao período de internação. Se o tutor não respeitar o prazo estabelecido pelo médico veterinário, deve exigir que ele assine um termo de responsabilidade para que possa retirar o seu pet da clínica.

4. É uma boa prática disponibilizar um formulário para que o tutor preencha com informações do animal.

O médico veterinário deve obter o máximo de informações possíveis antes do início do atendimento ao paciente, mediante a disponibilização de um formulário a ser preenchido pelo tutor.

Essas informações são necessárias não só para a eficiência e a eficácia do tratamento, mas também para que o médico veterinário se proteja de problemas legais.

Note que o formulário não precisa ser complicado ou extenso. Ele nada mais é do que um questionário sobre a saúde e a vida do animal.

Quantos anos possui? Quais são as suas alergias? Está com as vacinas em dia? Já fez alguma cirurgia? Toma medicamentos regularmente? Essas são algumas das perguntas que devem constar do documento que, ao final, deve ser assinado pelo tutor.

Apesar de simples, esse questionário pode ser fundamental em caso de problemas futuros.

Nesse sentido, imagine que o tutor não mencionou que o seu gato tem alergia a determinado medicamento. Ao realizar uma cirurgia, o medicamento é utilizado e o animal sofre graves complicações. O médico veterinário, de posse do referido formulário, poderá eximir-se de sua responsabilidade ao demonstrar que o tutor não cumpriu com a obrigação que lhe cabia.

É importante, também, que o médico veterinário tome nota de qualquer desconformidade na saúde do pet, e avise o proprietário. Dessa forma, deve alertar para a existência de lesões na pele, perda de pelo, inchaço, vermelhidão nos olhos, infecção de ouvido, entre outras observações que puderem ser feitas em um exame preliminar. Depois de avisado o tutor, essas observações devem ser inseridas na ficha do animal, juntamente com os exames (quando cabível) e os termos de consentimento devidamente assinados.

5. Os médicos veterinários e as clínicas veterinárias devem se atentar para a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº. 13.709/18) é uma norma que tem por escopo a proteção de dados pessoais que são fornecidos para órgãos públicos e empresas privadas.

Um médico veterinário ou uma clínica veterinária tem acesso a uma série de dados do tutor do animal, os quais deverão ser tratados de acordo com a legislação vigente.

Sendo a aproximação do cliente pelo modo online ou presencial, é importante que lhe seja disponibilizado um termo com a política de privacidade da empresa para a colheita de dados, esclarecendo a finalidade da coleta, onde esses dados serão armazenados, quando e como serão descartados, entre outras providências. O cliente, ao concordar com o tratamento dos seus dados, deve assinar – virtual ou presencialmente – o referido documento.

É igualmente importante atentar para não realizar marketing de maneira ilícita e em desconformidade com a LGPD.

Se o cliente apenas deu consentimento para o armazenamento de dados para cadastramento do animal, não é lícito que os referidos dados sejam utilizados para a realização de marketing, seja por e-mail, seja por Whatsapp.

O consentimento com relação à utilização dos dados pessoais deve ser sempre específico, motivo pelo qual é importante se lembrar de perguntar se o tutor tem interesse em receber publicidade ou notícias variadas oriundas da clínica veterinária ou do médico veterinário.

6. A responsabilidade civil da clínica veterinária é objetiva.

Ao contrário do que ocorre com o médico veterinário, a responsabilidade das clínicas veterinárias é objetiva, ou seja, independe da comprovação de culpa.

Neste caso, exige-se, tão somente, que estejam presentes os demais requisitos da responsabilidade civil: ato ilícito, dano e nexo de causalidade entre os dois elementos anteriores.

A responsabilidade objetiva pode ser direta, quando o ato cometido é diretamente imputável à clínica veterinária. É o que acontece, por exemplo, em caso de contaminação hospitalar, queda do animal, lesões provocadas por um animal a outro na ausência do dono, entre outros.

De outro lado, a responsabilidade objetiva pode ser decorrente de atos de prepostos ou empregados. Nesse caso, a clínica veterinária pode responder pelo ato ilícito cometido por um médico veterinário ou enfermeiro, quando então verifica-se uma espécie de responsabilidade escalonada: em um primeiro momento, deve-se comprovar a culpa do empregado ou preposto, para que, posteriormente, haja a responsabilização da clínica veterinária de maneira objetiva pelo ato da referida pessoa.

De qualquer forma, a responsabilidade da clínica veterinária acaba sendo agravada em relação a dos médicos veterinários, uma vez que estes são profissionais liberais, e lhes é aplicado o disposto no art. 14, § 4º, do CDC.

Mesmo não sendo necessária a existência de culpa para que ocorra a responsabilização das clínicas veterinárias, essas podem se eximir de responsabilidade em algumas hipóteses: fato de terceiro, culpa exclusiva do tutor e caso fortuito e força maior.

Fato de terceiro ocorre quando um terceiro, que não integra a relação jurídica mantida entre as partes, atua de forma a gerar o dano sofrido pela vítima. Se um animal, sob supervisão do dono, fere um outro animal dentro da clínica veterinária, pode ser reconhecido o fato de terceiro.

A culpa exclusiva do tutor pode ser verificada quando ele não segue as recomendações do médico veterinário, e o seu animal vem a sofrer dano em decorrência dessa desconformidade às orientações recebidas.

Finalmente, há caso fortuito ou força maior sempre que um evento inesperado e inevitável acontece. Em uma clínica veterinária, o sequestro, a mão armada, de um animal de estimação pode ser considerado como caso fortuito, apto a afastar a sua responsabilização.

7. A obrigação do médico veterinário e da clínica veterinária é, em regra, de meio e não de resultado.

A última dica importante que você não pode deixar de conhecer é a de que a obrigação do médico veterinário e da clínica veterinária é, em regra, de meio e não de resultado.

Já ouviu falar nesses dois termos?

Obrigação de meio é aquela cujo adimplemento ocorre quando o profissional se empenha para obter um determinado resultado, mas não está obrigado a obtê-lo. Para que se considere a obrigação cumprida, basta que comprove que empregou seus melhores esforços para atingi-la.

A obrigação do médico veterinário é dessa modalidade porque ele não é obrigado a salvar ou curar o animal. Ele deve empregar as melhores técnicas e mais intensos cuidados para obter esse resultado, mas, se não conseguir, ainda assim se considera cumprida a sua obrigação, com o dever de recebimento de sua remuneração.

A obrigação de resultado é aquela que apenas se considera adimplida quando o resultado buscado é atingido. Normalmente, está relacionada com procedimentos meramente estéticos, e não quando o procedimento é necessário para a cura do paciente. Dessa forma, é considerada como obrigação de resultado a do cirurgião plástico, de forma que apenas será adimplida se houver uma melhora na aparência do paciente.

Como os médicos veterinários e clínicas veterinárias normalmente não oferecem tratamentos meramente estéticos para os animais, sua obrigação é vislumbrada como de meio.

Ao longo desse texto, tivemos oportunidade de obter 7 informações muito importantes sobre médicos veterinários e clínicas médicas: 1. a responsabilidade dos médicos veterinários é subjetiva; 2. a lei prevê a possibilidade de inversão do ônus da prova em casos de responsabilização de médicos veterinários e clínicas médicas; 3. médicos veterinários precavidos apresentam documentos para a assinatura dos tutores de seus pacientes; 4. é uma boa prática disponibilizar um formulário para que o tutor preencha com informações do animal; 5. Os médicos veterinários e as clínicas veterinárias devem se atentar para a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD); 6. A responsabilidade civil das clínicas médicas é objetiva; e 7. A obrigação do médico veterinário e da clínica veterinária é, em regra, de meio e não de resultado.

Com todas essas informações, ficou mais fácil de entender a responsabilidade civil dos médicos veterinários e das clínicas veterinárias? Me conta aqui nos comentários.

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